As quebras de sigilos bancário e de e-mail de Mariano de Castro Silva, apontado pela Sermão aos Peixes como operador do esquema criminoso que desviou mais de R$ 18,3 milhões dos cofres da saúde nos primeiros meses do governo Flávio Dino, do PCdoB, devem confirmar diversos pagamentos alheios aos contratos firmados entre terceirizadas e a Secretaria de Estado da Saúde (SES) para o gerenciamento de unidades hospitalares pertencentes à rede pública estadual no Maranhão.
De acordo com um manuscrito feito pelo médico, já confirmado pelo próprio como de sua autoria, na carta de despedida deixada onde foi encontrado morto, em Teresina (PI), quando cumpria prisão domiciliar, consultas aos extratos de suas contas e de cartão de crédito, além do correio eletrônico, comprovariam todos os gastos detalhados por ele, numa carta escrita em Pedrinhas, sempre com citação aos nomes dos supostos beneficiários.
Num dos trechos, Mariano diz que os pagamentos eram feitos por direcionamento do Palácio dos Leões. “Por pedido da Dra. Karla/Dr. Lula [provavelmente Karla Suely Trindade e Carlos Lula] – Vindo do Palácio… Paguei R$ 11 mil para urna e translado de um corpo de São Luís para outro estado… Transferi da minha conta para funerária. (…) Está no meu extrato”, detalha.
Esse caixão e o translado, segundo Mariano diz em outro trecho da carta, teriam sido pago para um membro do PCdoB nacional.
Ainda na carta, o médico diz que diversos serviços eram pagos por ele, por meio de cartão de crédito, mas colocados na prestação de contas dos institutos. A Organização Social Instituto do Desenvolvimento e Apoio à Cidadania (IDAC), alvo principal das operações Rêmora e Pegadores, desdobramentos da Sermão aos Peixes, também “pagava por fora vários serviços”, segundo Mariano. “Posso mostrar os extratos de transferências…. Pagos”, diz.
Em outro trecho, Mariano Silva diz que, além do IDAC, outros institutos também tiveram gastos alheios aos seus respectivos planos de serviços, e detalha que a previsão de recursos era sempre acima de 50% do valor pesquisado. “Teve uma vez que foi mandado um pedido de equipamento para o [Hospital] Carlos Macieira… chegou lá o orçamento era de 747 mil… eu mesmo liguei e o valor era na realidade 559 mil… o secretário autorizou 559 e nunca foi feita a aquisição… tem no meu ‘email’…”, alerta.
Operação Pegadores
Durante as investigações no âmbito da Sermão aos Peixes, a partir de um inquérito policial instaurado em julho de 2015, com base na revelação do ATUAL7 de que a enfermeira Keilane Silva Carvalho, amiga do então secretário estadual de Comunicação Social e Assuntos Políticos, Márcio Jerry Barroso, estava sendo beneficiada com um super contracheque de mais de R$ 10 mil por mês, foram coletados diversos indícios de que servidores públicos, que exerciam funções de comando na SES no primeiro ano do governo Flávio Dino, montaram um esquema de desvio de verbas e fraudes na contratação e pagamento de pessoal.
Os beneficiários do esquema eram pessoas indicadas por agentes políticos: familiares, correligionários de partidos políticos, namoradas, amantes e companheiras de gestores públicos e de diretores das organizações sociais. Louis Philip Moses Camarão, pai do secretário estadual de Educação, Felipe Camarão, por exemplo, ao falar sobre uma mulher identificada como Dália de Sousa Veigas Azoube, que seria funcionária fantasma, foi flagrado em intercepção telefônica tecendo comentários desabonadores a respeito dela. “Conheço, na hora que eu olhei identifiquei logo, pelo perfil glúteo”, diz.
Ainda segundo as investigações, foram encontrados indícios da existência de quase 430 pessoas que teriam sido incluídas indevidamente nas folhas de pagamentos dos hospitais estaduais, sem que prestassem qualquer tipo de serviços às unidades hospitalares. A relação dessas pessoas, segundo a PF, era controlada por Lenijane Rodrigues da Silva Lima, cunhada de Márcio Jerry. Ela teve determinado pela Justiça Federal o bloqueio em mais de R$ 50 mil em suas contas bancárias.
O esquema de fraudes e desvio de verbas públicas na contratação e pagamento de pessoal funcionava da seguinte maneira:
a) Pessoas que possuíam um salário formal, pelo qual recebiam pela função contratada, contudo recebiam um salário extra, pago por fora do contracheque, em desvio direto de verbas públicas na denominada “folha complementar”;
b) Pessoas que eram indicadas para serem contratadas e recebiam sem realizar qualquer trabalho (funcionários fantasmas);
c) Desvio de verbas através do pagamento a empresas de fachada, supostamente especializadas na gestão de serviços médicos.
Quanto às empresas de fachada, segundo a força-tarefa da Sermão aos Peixes, uma sorveteria passou por um processo de transformação jurídica e se tornou, da noite para o dia, uma empresa especializada na gestão de serviços médicos. Essa empresa que era uma sorveteria, identificada como O.R.C Gestão e Serviços Médicos Ltda, foi utilizada para a emissão de notas fiscais frias, que permitiram o desvio de mais de R$ 1,2 milhão. Osias de Oliveira Santos Filho, proprietário da O.R.C Gestão e Serviços Médicos, conforme revelou o ATUAL7, tem bom trâmite dentro do Palácio dos Leões e com membros do alto escalão do governo Dino.
De acordo com a Polícia Federal, Ministério Público Federal (MPF), Receita Federal e Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU), o dano aos cofres públicos pode ser ainda maior que os R$ 18,3 milhões já confirmados como desviados, pois os investigadores apuraram que a orcrim teria continuado a operar o esquema criminoso mesmo após a deflagração da Operação Pegadores.
Fonte : Atual 7