O Estado do Maranhão e o Município de Barra do Corda foram condenados a pagar indenização a título de danos morais, no valor de R$ 50 mil mais uma pensão mensal, correspondente a 2/3 do salário mínimo, a uma viúva pela morte de um lojista do ramo de vidraçaria, que foi preso no antigo “gaiolão” da Delegacia de Polícia da cidade, em 2017.
O juiz Antonio Queiroga Filho (1ª Vara de Barra do Corda) acatou pedido da viúva de Francisco Lima Silva em Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais proposta contra o Estado e o Município com pedido de condenação destes no pagamento de indenização a título de danos morais e materiais pela morte do marido.
Segundo os autos, no dia 8 de outubro de 2017, Silva se envolveu em um acidente de trânsito, com colisão frontal na BR-226, nas proximidades da “Ponte Nova”, em Barra do Corda, e foi levado para a UPA pela Polícia Militar, onde teve de esperar por duas horas até que o único médico de plantão na unidade lhe prestasse atendimento.
Depois do atendimento inicial, foi constatado que ele estava com a pressão arterial alta, porém, não foi medicado, passando apenas por sutura de uma lesão no cotovelo esquerdo e, em seguida recebeu alta médica, autorizada pelo médico plantonista. Na sequência, foi detido pela polícia e conduzido para a carceragem da Delegacia de Polícia local.
GAIOLÃO
Silva foi colocado na cela conhecida como “Gaiolão, destinada ao banho de sol dos presos custodiados, a céu aberto, debaixo do sol, sem condições de saúde e higiene, remédios ou alimentação, onde passou mais de 18 horas, sendo encontrado no dia seguinte, deitado no chão, inerte, vindo a morrer em seguida, por “arritmia cardíaca e convulsões febris”.
Os fatos teriam sido presenciados pela mãe da vítima, técnica em enfermagem há mais de vinte anos, que questionou o médico plantonista sobra o perigo da alta médica do filho, diante do quadro de pressão alta, momento em ouviu do médico que a pressão estaria alterada em razão da ingestão de bebida alcoólica pelo paciente. Além disso, a sua sogra disse que embora a vítima tenha sido conduzida para a delegacia por volta das 14h40 horas, o delegado plantonista chegou somente 17h20 horas, e, 19h30 horas saiu para jantar e não retornou.
ARGUMENTOS DA DEFESA
O Estado argumentou que os policiais agiram “no exercício do poder de polícia e, portando, no estrito cumprimento do dever legal”. Já o Município alegou que os profissionais de saúde que atenderam a vítima “não se omitiram a lhe prestar a assistência que era possível na unidade de saúde municipal”.
O juiz fundamentou a sentença na Constituição Federal e no Código de Processo Civil. Segundo a ordem judicial, a responsabilidade civil do Estado está prevista no artigo. 37, parágrafo sexto da Constituição Federal: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”. E, ainda, no artigo 43 do Código Civil: “As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros…”.
“…Essa obrigação de manter condições mínimas de alojamento decorre de diversas normas nacionais e internacionais ratificadas pelo Brasil, começando pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (promulgado pelo Decreto nº 592/92), cujo artigo 10, item 01, assegura que “toda pessoa privada de sua liberdade deverá ser tratada com humanidade e respeito à dignidade inerente a pessoa humana”, ressalta o juiz na sentença.
“Com base nisso tudo, dúvida não resta de que o Estado do Maranhão deveria ter mantido condições mínimas de bom encarceramento ao Senhor Francisco Edine naquele fatídico dia. Logo, falhado nesse dever, legítima é a reparação pretendida”, concluiu o juiz.
INSPEÇÃO EXTRAORDINÁRIA
Nos autos, o juiz informou que ao tomar conhecimento do fato realizou Inspeção Extraordinária para investigar os fatos, e apurar a situação de funcionamento da 15ª Delegacia Regional de Barra do Corda, que concluiu pela precariedade das estruturas físicas do prédio, e foi objeto de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público em conjunto com a Defensoria Pública, o que resultou na reforma estrutural do cadeia pública e melhorias nas condições de higiene e saúde dos presos, passando, inclusive, a unidade a ser gerida pela Secretaria de Administração Penitenciária – SEAP.